(Víctor Lemes)
Me pediram, no começo da semana, para que eu fizesse algo para sexta-feira. E pensei: "O que há nesta sexta-feira?" - apenas me disseram que era uma data importante. Liguei o computador, entrei no Google e descobri que essa sexta-feira era dia 8 de março; e por ser 8 de março, a Organização das Nações Unidas criou, em algum lugar no passado, o dia Internacional da Mulher! Então, pensei: "Ok. O que há de tão importante para comemorar no dia Internacional da Mulher?".
Se você parar para pensar um pouquinho, 66% do trabalho de todo o planeta Terra é feito por mulheres, enquanto elas recebem ao final do mês aproximadamente 16% menos salário do que os homens. Outra coisa interessante para se comemorar nesta sexta-feira é o fato de que em muitos países as mulheres são consideradas como alguém, ou "algo", para cuidar da casa, das crianças, ou fazer bebês. Eu e você sabemos que não é preciso ir tão longe para perceber quão injusto as mulheres são tratadas. Por exemplo, aqui no Brasil, criamos o padrão de se ter empregadas domésticas, ou vulgo "doméstica". Não há um "empregado doméstico" na casa do seu amigo. Por que não? "Porque mulheres realizam esse trabalho com mais afinco! Elas já estão por décadas acostumadas!" A maioria segue um paradigma de que mulher é boa para cozinhar, passar, limpar a casa. Se a ONU criou este dia para comemorarmos, pois então, não nos esqueçamos das "mulheres-objeto", as quais são vistas e tratadas como tal, a fim de prazeres carnais machistas. Veja só! Temos alguma coisa a comemorar sexta-feira!
Existe uma música do Tears For Fears, no qual o cantor diz que ainda há "mulheres acorrentadas", ou seja, mulheres sem liberdade. Daí tem aquela história da fábrica cheia de trabalhadoras, que foi incendiada, matando assim muitas mulheres em nome da liberdade feminina. Muitas mulheres morreram por este ideal aquela dia, e dali em diante, a mulher passou a ter alguns poucos direitos similares aos homens. Mas aquela liberdade... onde está? Não a encontrei ainda. Não a vi passar. Teimo dizer que as mulheres ainda não são livres. Nem um pouco.
Veja bem, até nas coisas mais simples elas não são livres. Não podem andar de shorts nas ruas, sem ter algum olhar maldoso de homens nojentos e sedentos por suas pernas, para saciar suas frustrações sexuais. E ainda outro paradigma curioso: imaginemos um homem num dia quente. Em vez de vestir sua camiseta regata, ele prefere não vestir nada. E ao passear na rua sem a camiseta, ninguém passa indignado e fala: "Que pouca vergonha! Quem ele acha que é? Está sem camiseta na rua!". Não, ninguém diria isso. Troquemos o gênero do protagonista deste exemplo, e imaginemos agora uma mulher. Jamais poderia fazer o mesmo. Diriam: "Que sem-vergonha! Quer chamar atenção, só pode!".
Quais são os paradigmas que seguimos? Cadê o bom-senso neles? Como poderíamos comemorar um dia internacional da mulher quando temos uma porrada de hipocrisia perante nossos olhos? Diria você, que poderíamos comemorar o direito de trabalhar, e o direito de voto (este último, porém, não vejo muito ganho; afinal, vai me dizer que acredita em democracia?).
Mas vamos lá! Vamos comemorar esta sexta-feira em nome das muitas mulheres em Israel, China, Coreia, África, e Índia! Vamos comemorar seus livre-arbítrios! Vamos ficar felizes por todas que estão no meio das guerras! E aquelas que são abusadas sexualmente e espancadas todos os dias! Vamos celebrar seus gritos de desespero num salão cheio de homens que não fazem nada para ajudar!
O que estou fazendo aqui? Estou preso num paradigma no qual queria não fazer parte! Não vejo o porquê de tudo isso. Não entendo por qual razão devo eu chegar aos meus alunos e dizer: "Ouçam, alunos! Vamos comemorar o dia internacional da mulher!" - para quê? O indivíduo não respeita a mãe, a tia, a irmã, a avó, a empregada... depois veste a máscara todo oitavo dia de março, e diz: "Ah, como eu amo as mulheres! Elas merecem o que há de melhor no mundo! Vem cá, docinho, pega essa flor para você!". Ah... Dá um tempo!
Mais tarde, no dia 12 de outubro, iremos comemorar o Dia das Crianças! Repetindo a mesma ladainha... e ninguém vai se lembrar das crianças que desaparecem todos os dias; daquelas que são usadas como jovens soldados nas guerras; aquelas que, similarmente àquelas mesmas mulheres, são abusadas sexualmente e agredidas física e psicologicamente. Ou ainda, aquelas crianças que morrem de fome, não só na Etiópia, como aqui no Brasil!
Comemorar uma "data especial" é sinônimo de esquecer, por um dia, que existem ainda muitas coisas más ocorrendo no mundo. Como estamos muito ocupados cuidando dos nossos relatórios nos outros 364 dias, reservamos pelo menos um para nos lembrarmos de determinada situação, pessoa, ou profissão. "Eles" criaram estas datas "especiais" para que alimentássemos a economia, sua filha mais querida. Compramos presentes em datas especiais, seja para crianças, adultos, idosos, cachorros ou passarinhos. Fomos condicionados a isso: Natal, Aniversário, Páscoa, Dia Internacional da Mulher, Dia do Professor, etc... Por que celebrarmos a vinda do Mestre apenas no dia 25 de dezembro? Ou meu aniversário apenas em 15 de junho? Se temos uma convenção de trezentos e sessenta e cinco dias para assim o fazermos!
Não entendo como este paradigma ainda se mantém! Não acredito nele... não compro essa ideia. Muito menos sinto vontade de olhar para meus alunos e convidá-los a comemorar determinada data "porque é importante"... "Vamos ficar felizes pelo livre arbítrio que não é interferido pelos ideais dos homens, que todas as mulheres têm!"... Não posso fazer isso.
Se você quiser comemorar o dia da mulher, por favor assim o faça todos os dias da sua vida. Não reserve um único dia para isso. Outra coisa: quando for celebrar, tente se lembrar de algo bom. Não de uma tragédia que aconteceu num dia 8 de março...
Como alguém pode comemorar uma tragédia?